O Sol escondia-se no horizonte, e seus últimos raios batiam no meu corpo ainda úmido. Sensação, simultaneamente, agradável e estranha, a água atravessa-me pelos poros. Nesses momentos, me sinto viva. [Aliás, quando você senti-se vivo? - eu e meus diálogos. Voltemos à narrativa!]
Não me lembro nem o dia, muito menos a hora exata. O que me lembro é do entardecer, de um banco e de um par de olhos úmidos.
O Entardecer. O céu era límpido, não era azul, nem laranja ou vermelho, mas a mistura resultante fornecia-me uma paz indescritível. Em uma razoável frequência, pássaros quebravam a tal paz com suas asas e bicos, porém a beleza permanecia. O vento, quando vinha ao meu encontro, balançava-me da mesma forma que uma mãe nina seu filho. Isso também me fazia sentir viva.
O Banco. Era singelo. Cimento e granito. [Sim, um parente próximo.] Exacerbadamente reto e rígido. Se me permitir uma analogia, a usarei agora. Aquele banco era como um senhor moldado pela sociedade para ser reto e rígido, e por mais que esse, no seu íntimo, quisesse ser mais maleável e curvilíneo, não poderia, pois sua concepção é a de que nasceu para ser reto e rígido. Dessa maneira, o vento que em mim parecia um carinho materno, nele chegava como um tapa de um algoz. Mas ele continuava, aparentemente, impassível, afinal, era reto e rígido.
E por fim, os olhos. Eram castanhos. Não os percebi de imediato. Para ser sincera, o Entardecer e o Banco traziam-me maior presença de vida do que eles. Mexiam-se às vezes, culpa do vento que os faziam piscar. Mas só. A princípio cheguei a ter esperanças que olhavam para mim. Todavia, não focalizavam nada externo. Estavam úmidos, mas não choravam. Provavelmente cansados de tal ato. Para onde eles olhavam então? Uma foto ligeiramente amassada nas mãos parecia dar-me uma pista. Refletindo, cheguei a uma conclusão aceitável. Aqueles olhos tinham, não uma pedra, mas uma lembrança no meio de seu caminho.